No terraço da Usina Santo Inácio, no Cabo de Santo Agostinho, Mata Sul de Pernambuco, jovens da elite política, empresarial e intelectual debatiam saídas para a economia do estado, diante do declínio da indústria açucareira. O ano era 1968. Enquanto olhavam do alto a bela paisagem da região, com manguezais ainda intocados, protegidos por arrecifes, eles chegaram a uma conclusão: construir naquele paraíso um porto-indústria aos moldes europeus. Formava-se ali mesmo, nas coxias da agroindústria canavieira, uma força-tarefa com objetivo de mobilizar governos e a opinião pública em torno da nova missão econômica do estado – Suape.
As memórias desse dia e suas correlações com a formação do Complexo Industrial Portuário instalado no Litoral Sul pernambucano foram descritas pelo jornalista Anchieta Hélcias, que integrava o grupo e se tornaria presidente da Diper, atualmente Ad Diper (Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco) anos depois. O relato publicado no livro “Suape: muito mais que um porto, uma visão econômica”, de Carlos Garcia e Josué Mussalém, revela como o projeto tido por carta de alforria da economia do estado à produção sucroalcooleira, que regia os negócios desde tempos coloniais, já nasceu entre contradições, como será visto a seguir.
O modelo de porto-indústria foi proposto pelo padre Lebret, ainda na década de 50, como uma imagem futurista. Mas a realidade terminou repetindo modelos antigos de escravidão e do sistema de plantation, exemplo da modernização conservadora que marca a história do desenvolvimento econômico brasileiro. Assim, saíram de cena os senhores de engenho, entraram as grandes corporações. Eliminou-se a figura do escravo, mas permaneceu a exploração do trabalho da mão de obra barata e descartável.
O estudo de viabilidade de Suape foi construído na década de 70, com as bençãos da ditadura militar e do general Ernesto Geisel. Seu território de cerca de 13,5 mil hectares entre o Cabo de Santo Agostinho e Ipojuca foi demarcado entre desapropriações ilegais, que empurraram os habitantes tradicionais para as periferias das duas cidades. A essas populações empobrecidas, mais tarde, as oportunidades de emprego no polo foram oferecidas como um caminho de salvação.
Embora seja um projeto de mais de cinco décadas, o porto-indústria entrou no foco da economia do estado apenas nos anos 2000, quando os investimentos federais chegaram pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
A política desenvolvimentista foi reforçada por programas de incentivos fiscais e acordos políticos que garantiram, regionalmente, a instalação dos polos petroquímico com a Refinaria Abreu e Lima (Rnest) – aguardada pelos pernambucanos desde a época de Lebret -, além da Petroquímica Suape e da Companhia Têxtil (Citepe), e o polo naval com primeiro estaleiro, o Atlântico Sul, um dos maiores da América Latina.
Foram esses empreendimentos, chamados de estruturadores, que atraíram outras empresas para o complexo, atualmente com mais de 100 indústrias.